5 de julho de 2015

Revisão: 'Sense8'

Criado por
Andy Wachowski, Lana Wachowski, J. Michael Straczynski

Elenco
Brian J. Smith, Tuppence Middleton, Miguel Ángel Silvestre, Max Riemelt, Tina Desai, Aml Ameen, Doona Bae, Jamie Clayton, Naveen Andrews

Canal: Netflix

Classificação IMDb: 8.4 | Metascore: 63 | RottenTomatoes: 68%
Classificação Barba Por Fazer: 65


- Abaixo podem encontrar Spoilers - 
A História: 
    Mais uma série original da Netflix. Os irmãos Andy e Lana Wachowski, criadores de The Matrix, juntaram-se a J. Michael Straczynski e criaram um conceito com uma premissa interessante: oito estranhos, espalhados pelo mundo, tornam-se mental e emocionalmente ligados entre si. Esta conexão fá-los partilhar emoções, sensações e conhecimentos. A série, com algo de 'Lost', 'Heroes' e 'Flashforward' e muito de inovador, é um bom projecto de ficção científica (claramente mais próximo do nível do primeiro Matrix do que dos últimos filmes dos irmãos, 'Jupiter Ascending' e 'Cloud Atlas', embora partilhe algumas ideias com o último), e é uma daquelas séries capaz de dividir a audiência. Quem a vê, chega a rever; quem não gosta, não passa dos episódios iniciais.
    A ideia da série é interessante e reserva potencial, com a 1.ª temporada a servir de (deficiente e curta) introdução ao conceito de sensate (nome dado àquilo que as personagens principais são) e principalmente às 8 personagens em si. O elenco é heterogéneo, para explorar diversas culturas, e é constituído por: Riley, uma DJ islandesa que vive em Londres; Will, um polícia de Chicago; Lito, um actor espanhol a viver no México; Nomi, uma transsexual hacker norte-americana; Sun, uma executiva coreana que faz kickboxing; Capheus, um queniano motorista de autocarro; Kala, uma farmacêutica indiana; e Wolfgang, um ladrão alemão.
    Numa série deste género, é fundamental haver algum tempo para assimilar informação e beber vários contextos e histórias individuais. A Netflix deu aos criadores esse espaço, com a primeira temporada a ter uma evolução interessante e a explorar a identidade, a sexualidade e a partilha de privacidade. Para os sensates, como para nós, tudo é novo; e a capacidade de entre-ajuda e ligação (mais forte entre determinados pares das 8 personagens) promove vários bons momentos de televisão.
    Trata-se de uma série que exige que a audiência tenha mente aberta, e ao longo dos 12 episódios cada personagem enfrenta várias dificuldades, enquanto cada um tenta compreender aquilo que se está a passar, e os criadores optaram por manter as histórias sempre paralelas (como em 'Game of Thrones'), não "dedicando" um dos primeiros oito episódios principalmente a um elemento (prática de 'Orange is the New Black' ou 'Skins').
    Ao longo desta season, verificamos que os pares mais próximos são Riley-Will, Kala-Wolfgang, Lito-Nomi e Capheus-Sun, e estas ligações provocam várias cenas emotivas, cómicas, quentes ou simplesmente bem coreografadas. Como não podia deixar de ser, o selo The Wachowskis é garantia de muita acção mas também de uma narrativa inteligente.

    Desta 1.ª temporada destacam-se alguns momentos de luta (as parelhas Sun-Capheus e Wolfgang-Lito em destaque, sobretudo), e vários momentos de partilha cinematograficamente bem conseguidos: o momento em que os 8 cantam 'What's Up' no episódio 4 (se gostarem de 'Sense8' será possivelmente a partir daí) e, numa série gráfica e com nudez, a orgia no episódio 6 acaba por deixar marca. É esquisita, é polémica e provocante, mas é definitivamente arte.
    Se nessa orgia não há nada que pareça estar a mais, o mesmo não se pode dizer de alguns momentos desnecessários (o grafismo dos partos na extraordinária cena em que Riley, e todos os outros, ouvem o concerto do seu pai, e ainda com Riley sozinha no último episódio, era escusado) ou do facto de toda a gente na série falar inglês (com tamanha multiculturalidade seria confuso a constante troca de idiomas, mas assim é pouco real) mas no geral 'Sense8' pode tornar-se um caso interessante, não uma série de topo, mas ainda pode também descambar.
    
A Personagem: Lito Rodriguez (Miguel Ángel Silvestre).
    De certa forma, 'Sense8' consegue dar às 8 personagens um período de contextualização semelhante. Só visitamos o passado de alguns, mas acompanhamos os problemas do quotidiano de cada um em proporção quase idêntica. Will está projectado para ser o "herói", Nomi e Kala precisam de mostrar mais, e Sun (a actriz Doona Bae, sempre com os irmãos Wachowskis) tem muitos momentos badass, mas não está ao nível das 4 personagens mais interessantes: Riley, Capheus, Wolfgang e Lito.
    No caso do alemão Wolfgang, é talvez a personagem com mais potencial, o anti-herói pelo qual somos levados a torcer. Capheus é o mais genuíno dos 8, e Riley parece ser a figura convergente do agrupamento, uma verdadeira personagem - uma DJ islandesa com uma madeixa azul no meio do seu cabelo oxigenado! No entanto Lito Rodriguez, interpretado pelo actor Miguel Ángel Silvestre (talvez dos 8 o único capaz de ambicionar a outros voos) é talvez o maior destaque. Estupidamente poucas vezes uma personagem gay consegue ser tão consensual entre os fãs - Omar Little, The Wire, é uma das excepções - e Lito não é quem tenha a melhor história ao longo da temporada, porque Capheus, Wolfgang e Riley têm um percurso mais cativante, mas destaca-se por si só. Vemo-lo grande parte do tempo a gravar as cenas do seu novo filme e o carismático mentiroso acaba por guardar um segredo durante parte da temporada, beneficiando das 2 boas personagens que o acompanham - Hernando e Daniela.
    O desempate a favor de Lito faz-se também pelas cenas em que participa. Está em todas as grandes cenas do grupo, brilha na sua "troca de conhecimentos" com Wolfgang, contribui de forma cómica, mas também de forma profunda na conversa com Nomi no museu Diego Rivera, ou na forma como se deixa declinar ao som da estrondosa versão alternativa de "Knocking on Heaven's Door".

O Episódio: 12 'I Can't Leave Her'.
    Ao longo da temporada há vários momentos marcantes em vários episódios, mas a finale é o episódio mais consistente. É aquele em que vemos as personagens mais maduras, a abraçar o seu destino e a contribuírem/ entrelaçarem-se de forma mais interligada; e é também o episódio em que temos um flash dos momentos de Riley e Will, e finalmente se percebe de que é que Riley tanto foge. A decisão e o destino de Will, bem como aquela bela reunião dos 8 no barco ao som de Sigur Ros chega para fazer do último episódio o melhor. Não havia melhor plano possível do que aquela reunião ao pôr-do-sol.

O Futuro: 
    Os 3 criadores da série têm, supostamente, todo o argumento da segunda temporada projectado e um plano para 'Sense8' ser uma série de 5 temporadas. A Netflix vai renovar? Muito provavelmente sim.
    A série tem potencial, mas ainda pode ser tudo - uma série ao nível do que o pioneiro 'The Matrix' representou para o Cinema, ou apenas mais uma série que no fim pouco acrescentou como 'Heroes', ou que se perdeu no esquecimento como 'Flashforward'. O conceito é interessante, e os Wachowskis - em parelha com Straczynski - têm cabeça para dar um seguimento esquisito e futurista, mas bom.
    Na segunda temporada terão que ser dadas mais explicações sobre os sensates, Whispers e o seu clã. E numa série tão focada na interligação das personagens, é crucial que a evolução de cada um e a aproximação física do grupo seja bem trabalhada. O segredo de um sucesso futuro passará sempre por "agarrar" o público às personagens e não tanto à ficção científica que rege 'Sense8'. Há demasiadas perguntas por responder, e a maior delas todas é mesmo: que capacidade terão criadores e actores de tornar 'Sense8' um caso sério? Porque não, não é uma certeza.

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