20 de novembro de 2011

Preto no Branco (caso Alan-Javi García)

Depois do sucedido entre os jogadores Alan e Javi García decidi, como se costuma dizer na gíria, pôr tudo “preto no branco”.

Nunca fui muito bom com leis. Nem nunca fui muito bom com especificidades e denominações de raças.
 Na actual moldura penal desportiva, chamar “preto de merda” dá uma multa monetária; inventar que alguém chamou “preto de merda” confere uma suspensão de alguns jogos. De que serve então inventar? Mais à frente perceberão. Quando vemos um indivíduo de pele amarela referimo-nos a ele como “um chinês”. Bem sei que a China é grande, mas os japoneses, os coreanos (os do Norte não contam porque estão isolados) e os outros não se sentirão marginalizados? Neste caso não é racismo, mas  não é correcto. Ao que investiguei a terminologia correcta é chamar a alguém negro ou pardo. No entanto, preto é o mais comum. Tal como branco é o mais comum, visto que não vejo o termo “caucasiano” a circular muito por aí. Usando as denominações que seriam vistas como politicamente correctas, poderíamos cruzar-nos com um indivíduo pardo verticalmente desfavorecido. Traduzido para linguagem normal, um preto anão.

Em Braga, parece que não são muito bons com electricidade. Basicamente, não são bons no geral quando o Benfica vai lá jogar. São coincidências…
Eu não conheço o Javi García pessoalmente, nem tão pouco o Alan. Mas tenho acompanhado a carreira de ambos nos últimos anos e, como tal, tenho capacidade de ajuizar a situação e o contexto geral, nunca com os dados todos mas com alguns.

Ponto 1 – No dia 6 de Março de 2011, num jogo para a 22ª jornada da Liga ZON Sagres, Javi García foi expulso por supostamente agredir Alan. Num lance que, como mais tarde se veio a constatar pelas imagens, a falta fora cometida sim por Alan. A expulsão não teria nunca acontecido se Alan, num completo desrespeito pelo colega de profissão e falta de fair-play, se agarrasse à garganta, onde Javi García não lhe tocou claramente.

Ponto 2 – Voltando ainda atrás no tempo, no ano desportivo em que o Benfica se sagrou campeão, o clube encarnado perdeu por 2-1 em Braga. Na altura, ao intervalo, Cardozo foi expulso após, ao tentar acalmar a confusão, ter sido agredido por Márcio Mossoró e Ney Santos (como imagens mostram claramente).

Ponto 3 – O Braga não é o melhor anfitrião do mundo. Mas este ano a coisa descambou. No passado dia 6 de Novembro, o Braga-Benfica foi interrompido por 3 vezes na primeira parte, sempre quando o Benfica estava por cima no jogo. Durante as paragens, os jogadores do Benfica revelavam preocupação, os do Braga mantinham-se completamente descontraídos como se a falta de luz fosse parte do menu deste ano. Após o Braga alcançar a vantagem no jogo, a luz não mais faltou.

Ponto 4 – Djamal deveria ter sido expulso por agressão violenta a Nicolas Gaitán, logo aos 5 minutos de jogo.

Ponto 5 – Alan teve, aos 78min de jogo, uma entrada duríssima sobre Javi García, apenas sancionada com cartão amarelo por Pedro Proença. Era justo o cartão vermelho. Na altura, após a entrada violenta, Alan foi pedir desculpa a Javi García.

Ponto 6 – No final do jogo, Alan em declarações aos jornalistas disse: “O resultado é injusto, merecíamos ter vencido. Mostrámos que estamos muito fortes e dou os meus parabéns a todos os companheiros de equipa. Não havia água quente no balneário do Benfica? No nosso também não”.
                 
                 Ao contrário dos 2 anos anteriores, o Braga não conseguiu vencer o Benfica na Pedreira. Com os seus truques da Idade da Pedra, o resultado acabou em 1-1 e para a memória de qualquer adepto que tivesse assistido ao jogo, no final dessa noite, ficava naturalmente o escândalo dos 30min perdidos com a suposta falta de luz.
                 
                 No dia seguinte, Alan acordou sobressaltado. Provavelmente tivera um pesadelo. Ao que parece, o brasileiro lembrou-se que, na noite anterior, Javi García lhe teria chamado “preto de merda” e que tinha desejado a morte dos seus filhos. No entanto, depois disto acontecer pediu-lhe desculpa com todo o cuidado após o ter pisado com os pitons (ponto 5) e não achou importante referir isso aos jornalistas no rescaldo do jogo (ponto 6).
                Então? O que é que se passou? A minha imaginação às vezes é fértil. Mas desta vez não tive que puxar muito por ela. O Braga tratou de escamotear os acontecimentos (falta de luz, decisões de arbitragem, falta de água no balneário) do Braga-Benfica, com uma notícia que teria, pela sua associação ao racismo, valor de notícia muito superior e que atingiria um mediatismo muito superior, fazendo os outros acontecimentos caírem em esquecimento. Como de resto, caíram.
                 
                Assim, António Salvador tratou apenas de acordar Alan e disse-lhe o que havia de dizer. Naturalmente, Alan decidiu dar-lhe um toque pessoal e acabou por se baralhar nas matemáticas. É que António Salvador escrevera “70% dos negros são benfiquistas”, mas Alan preferiu dizer “70% dos benfiquistas são negros”. Alan, um pequeno Pitágoras.
                A tudo isto, o bom jornalismo nacional decidiu acrescentar o momento das imagens que revelavam Javi García a ser racista para com Alan. Um momento em que aparece de boca tapada. O que é que isso faz dele? Esperto. E, de certa forma, educado. Em qualquer jogo de futebol, seja de que escalão for, amador ou profissional, há asneiras, linguagem imprópria. E como Jesus disse “o que se passa em campo, fica em campo”. Para não vermos um jogador a ofender a mãe de outro, mais vale de facto ele estar de boca tapada. Ou então Alan cheirava bastante mal.
                Depois houve o testemunho de Djamal. Sim, o Djamal que, como indicado no ponto 4, deveria ter sido expulso aos 5min de jogo. Mas pronto, estava em campo nessa altura.
                 
                Agora reparem, estamos a 20 de Novembro. Passaram apenas 14 dias desde o jogo e o assunto já caiu no esquecimento de quase toda a gente. Porque era o que o Braga queria. Criar um assunto para mascarar uma situação grave e real.
                
                 Em suma, o que se passa ano após ano em Braga é falta de ética, respeito e profissionalismo. E o Alan é a figura que melhor personifica a ausência destes valores. Citando a acusação, de algum modo infantil, de Eusébio: “Alan… é um estúpido”.         

Tive ao longo da minha vida muitos amigos pretos e muitos amigos brancos. A forma como os tratei e trato foi e será sempre igual. Um jogo num campo de futebol é um momento e um local onde não há diferenças entre homens. Todo o homem que respeita os outros, espera ser respeitado. No outro dia, porém, compreendi em conversa com amigos que todos nós já fomos racistas em pequenos. Mais racistas que o Javi García. E por isso, se ele o tiver sido, naturalmente que agiu mal, mas nós não temos moral para o criticar. Afinal de contas, quantos de nós, no tempo da escola primária, não tínhamos um lápis de cor que era o “cor de pele”? E agora, pensem na cor dele… MP

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