Série: Mad Men
Actor: Jon Hamm
por Lorena Wildering
Fato bem engomado, chapéu não pode faltar, um cigarro Lucky Strike entre os
lábios e um old fashioned para começar bem o dia. Estamos em Nova
Iorque, na era mad men dos anos 60. Um termo supostamente atribuído a
publicitários de Madison Avenue, onde se encontravam centradas as grandes
agências de publicidade da altura, deu nome a esta série criada por Matthew
Weiner, sempre envolta em segredo absoluto.
Donald Draper, interpretado pelo fabuloso Jon Hamm, é a estrela principal.
Don é prova viva de que há pessoas que não são aquilo que aparentam ser. Grande
parte da primeira temporada serviu para publicitá-lo enquanto o homem perfeito:
é pai de Sally, Robert e, mais tarde, Eugene, e marido da deslumbrante Betty
Draper (January Jones). Tem boa aparência, é charmoso, idolatrado e é um
excelente publicitário graças à sua intuição em compreender a mente do
consumidor, conseguindo atrair grandes clientes para a Sterling Cooper, agência
onde trabalha, tornando-o num dos profissionais mais cobiçados da área.
É o homem que todos os outros querem ser e que todas as mulheres querem
ter, que o diga a quantidade de casos extraconjugais que vai tendo ao longos
dos anos. Como qualquer personagem, Don tem vários vícios como o álcool e o
tabaco, mas o mais sério é o sexo.
Lentamente, os escritores revelam que nem tudo na vida de Don é um mar de
rosas. O que parecia o casamento perfeito, é tudo menos isso. As suas infidelidades
continuam, mas começamos a perceber que o acto em si não é o que o move. É um
homem perturbado que quer desesperadamente encontrar alguém com quem sinta uma
conexão emocional e, para seu desastre, acaba por nunca conseguir.
A razão desta fome emocional faz sentido quando descobrimos que Don Draper
não é quem diz que é. Don afinal é Dick Whitman, filho de um pai violento e
duma prostituta que não resistiu ao parto, e passa a sua infância num bordel a
roubar as carteiras dos clientes que por lá passam.
Escapa esta vida negra quando adopta a identidade de um homem morto.
Enquanto militar a servir na Guerra da Coreia, Dick assume a identidade do
Tenente Don Draper quando este é apanhado numa explosão. Troca de
identificação, assume o seu nome, quebra todo o contacto com a sua família e
recomeça uma vida nova.
O primeiro contacto com o mundo da publicidade surge quando Roger Sterling,
fundador da Sterling Cooper, entra na loja de casacos de pele onde Don
trabalha. Na parede está um anúncio feito pelo próprio, algo pelo qual tem
desenvolvido o gosto. Depois de várias manobras para fazer com que Roger o
contrate, regadas com doses de Martini durante o pequeno-almoço, Don cumpre o
seu objectivo.
Vemos que Don está na sua praia em momentos como a apresentação do novo
projector de slides para a Kodak. São três minutos em que ficamos em transe,
seduzidos pela escolha de palavras de Don (e pela entoação de Jon Hamm) que nos
evoca o sentimento de nostalgia. O publicitário
perfeito, portanto, que admite e bem, “what you call love was invented by
guys like me, to sell nylons”. Caímos que nem patinhos.
Este talento nato e uma vida dita ideal não foram o suficiente para afastar
o passado negro que ainda o assombra. O casamento com Betty chega ao fim, casa
com Megan, uma secretária, e divorcia-se de novo. Ele é precisamente o homem em
queda livre no início de cada episódio: os casos extraconjugais continuam uns a
seguir aos outros, o álcool, a depressão, e chega a ter várias quebras
psicológicas que até resultam no seu despedimento.
O fecho desta perturbada personagem termina, ironicamente, com um sorriso
na cara. As últimas cenas em que vemos Don é num retiro espiritual na
Califórnia, depois de anos de conflitos interiores e depois de ter desaparecido
de Nova Iorque sem deixar rasto. Depois de Don começar a rasgar um sorriso
enquanto medita de olhos fechados, a última cena de todas mostra-nos o real e
conhecido anúncio “Hilltop” da Coca-Cola, de 1971, criado pela agência McCann
Erickson — precisamente a agência para quem estava a trabalhar quando fez as
malas. Paira a questão: foi ou não Don o seu criador? Não me restam dúvidas.
Foi Don, sim. Não o Don perturbado e para sempre assombrado pelas feridas do
passado. O Don das ideias, o vendedor nato, o homem apaixonado pela
publicidade, o contador de histórias que nos embala e nos faz suplicar por mais
uma. So long, Don.
Nota Editorial: A compilação/ organização e ordem das personagens deste Top é responsabilidade de Miguel Pontares e Tiago Moreira. Os textos tiveram a colaboração de Lorena Wildering, Nuno Cunha, Cê e SWP.
Foram tidos em consideração séries com pelo menos 1 temporada, concluída a 1 de Outubro de 2015. Mais informamos que poderão existir spoilers relativos às personagens e/ ou às séries que elas integram, passíveis de constar na defesa e caracterização de cada uma das 100 personagens.