Falar de 2016/ 17 é falar de um Benfica que, com um super-plantel, soube manter-se focado no seu objectivo, ultrapassando as várias lesões que atormentaram o balneário. Rui Vitória, sempre determinado em encontrar soluções sem construir um muro de lamentações, comandou uma equipa que totalizou 82 pontos (menos 6 do que na época passada). O Porto de Nuno Espírito Santo, entretanto despedido, caracterizou-se pela incapacidade de aproveitar os deslizes do líder, e o Sporting caiu drasticamente (os leões somaram menos 16 pontos do que em 2015/ 16, e sofreram mais 15 golos, sendo por isso incapazes de manter o seu estatuto de melhor defesa, e terminando com o dobro dos golos sofridos do grande rival e primeiro classificado).
No Minho, um Vit. Guimarães recordista retirou ao Braga o quarto lugar, e entre as sensações da época a maior foi sem dúvida o Feirense, um patinho feio que virou cisne acabando num absolutamente extraordinário 8.º lugar.
Impossível também não referir a quantidade de vezes que as equipas portuguesas trocaram de treinador ao longo da época. Apenas Benfica, Porto, Sporting, Vit. Guimarães e Vit. Setúbal se mantiveram estáveis, com as restantes 14 equipas a terem pelo menos 2 treinadores (Braga, Belenenses, Arouca, Moreirense e Nacional chegaram mesmo aos 3 treinadores numa só temporada).
Como sempre, a falta de cultura desportiva em Portugal originou muita conversa, sobre tudo menos futebol, mas dentro do campo, os corações voltaram a bater rápido ao ritmo dos intérpretes: Pizzi comandou o campeão, Bas Dost quase apanhou Messi, Ederson e Vaná acumularam defesas impossíveis, Soares evoluiu a olhos vistos, o menino Gelson partiu a loiça toda, Nélson Semedo foi apanhado em excesso de velocidade, Fábio Martins marcou golos de levantar o estádio e Lindelöf marcou aquele livre em Alvalade.
Vamos lá analisar, equipa a equipa, esta Liga NOS 2016/ 17:
Em Portugal, o Benfica não tem rival. É o que diz o hino do clube da Luz e foi essa a referência utilizada pela Marca ao tetracampeão português. E a verdade é que a presente época e os resultados obtidos falam por si, confirmando o acentuar da hegemonia, a estabilidade e a consistência.
Estávamos na 5.ª jornada quando - poucas semanas depois dos encarnados terem visto um guarda-redes formado no clube, Bruno Varela, impedir o Benfica de vencer o primeiro jogo da época diante dos seus adeptos - o campeão nacional fez o derradeiro assalto ao 1.º lugar diante do Braga. Conquistado o trono, não mais as águias o largaram. E enquanto Sporting e Porto iam perdendo pontos em terrenos improváveis, os tricampeões distanciavam-se. Se no ano passado o pecado de Rui Vitória foi só ter vencido um jogo contra os dois rivais, este ano, na primeira volta, venceu o Sporting em casa e congelou a distância pontual que tinha no Dragão com um empate aos 90'+2. Tamanha ironia este mundo em que vivemos. Curioso verificar que nesta edição o líder acabou por ser inclusive a equipa com melhor aproveitamento nos jogos entre os 3 grandes (6 pontos conquistados, sem qualquer derrota nessa tríade, contra os 5 de dragões e leões). As águias podiam ter resolvido o tetracampeonato relativamente cedo, mas uma série mais negra em termos de futebol jogado, com reflexo nos resultados, acabou por dar vida ao Porto. A distância entre os dois maiores candidatos ao título de 2016/ 17 chegou a ser de apenas 1 ponto, mas os dragões nunca souberam aproveitar os deslizes.
Na fase final da Liga, viveram-se momentos tensos para o lado da Luz. Sob imensa pressão, Rui Vitória e os seus jogadores souberam (mais uma vez) blindar o balneário, resistindo à guerra jogada fora de campo, capaz de condicionar a arbitragem, e a todos os temas extra-futebol que voltaram a poluir o futebol português, uma consequência da falta de cultura desportiva em Portugal e do tempo de antena dado aos intervenientes errados. Ainda assim, viu-se novamente a fibra do grupo orientado por RV, com a equipa a embalar na recta final (na temporada passada, 12 vitórias consecutivas, nesta zero derrotas nas últimas 15 jornadas) e a acabar por selar o destino do campeonato com um empate em Alvalade e uma difícil vitória em Vila do Conde. Dois jogos de absoluta e similar importância.
Posto isto, é bem provável que o defeso seja quentinho no inferno da Luz, e que os cofres voltem a ficar recheados. Nesta época, Pizzi (que até nem deve ter assim tantos interessados) foi quem agarrou a batuta e orquestrou o ritmo do futebol praticado pelo Benfica. Com 4250 minutos em 52 jogos disputados ao longo da época, o general geriu os tempos da equipa e inventou muitos desequilíbrios com os seus passes a rasgar (ninguém em Portugal criou tantas oportunidades de golo como ele). Sem nunca se esconder, assumindo o jogo, fez-se MVP desta edição depois de tantas vezes ser criticado e pouco consensual entre os próprios adeptos. Depois, é impossível reflectir sobre este tetracampeonato sem falar de Ederson - um monstro, no bom sentido, claro. O brasileiro, imperial no um-contra-um e brilhante a distribuir jogo tanto com a mão como com o pé (que pontapé!), manteve o Benfica vivo em várias ocasiões, decidindo sozinho vários jogos com o seu misto de tranquilidade e loucura. O nº 1 benfiquista despediu-se de Portugal na final da Taça, mas pode não ser o único... Nélson Semedo, alegadamente cobiçado pelo Barcelona (fica difícil segurar um jogador quando clubes destes entram na corrida), foi incansável durante todo o ano. Correu, correu, correu e correu... Deu uma profundidade brutal ao flanco direito, evoluindo a nível defensivo, e voltando a exibir toda a sua velocidade e capacidade no drible. Mas a conquista do tetra não era possível sem o amuleto das águias. Fejsa é certamente um cyborg. Com menos lesões do que o habitual, o sérvio voltou a equilibrar a equipa, ajudando Pizzi como ajudara Renato Sanches, e passeando pelo campo a sua inacreditável capacidade física, dominando o seu sector com uma perna às costas. Esteve em todo o lado.
No ataque encarnado, e embora esperássemos maior rendimento por parte dos extremos, vários jogadores foram importantes em diferentes momentos. Mitroglou resolveu jogos atrás de jogos com a sua frieza, com o seu tau-tau e a sua pokerface, Jonas regressou da lesão para espalhar magia e Raúl voltou a resolver jogos cruciais. O mexicano parece ter nascido para marcar golos decisivos.
Prever o próximo ano é, para já, difícil. À procura do penta o Benfica manter-se-á estável e confiante (ganhar ajuda muito), mas pode ver o seu elenco a ficar bastante despido. Veremos como colmata essas saídas a chamada "estrutura". Somente com jovens valores já no clube, ou com intenso ataque ao mercado?
Quem nasceu na década de 90 estranha a (falta de) atitude e competitividade deste Porto. Até há bem pouco tempo tínhamos um Porto avído por vitórias e que jamais vacilava contra equipas de menor dimensão e nos momentos decisivos. A imagem desse Porto já não se vê há 4 (quatro!) anos. A nós, que crescemos com um Porto dominador, essa falta de chama no Dragão causa-nos alguma confusão.
O início desta Liga NOS não foi famoso. À derrota com o Sporting e ao empate com o Tondela, o Porto acrescentou 3 empates consecutivos (Vit. Setúbal, Benfica e Belenenses) causando grande preocupação na Invicta. Mas, depois de quase arredados na corrida pelo título, a equipa portista e os adeptos começaram a partilhar com Nuno Espírito Santo a crença de que era possível. Quando? Vitória ao cair do pano sobre o Braga, com um golo do miúdo Rui Pedro (marcou, e evaporou-se depois novamente para a equipa B). A partir daí, iniciou-se uma nova vida, com maior dinâmica (fundamental a "injecção Soares"), vitórias umas atrás das outras e vários jogos sem sofrer golos. O Benfica começou a escorregar e o antigo Porto parecia estar de volta.
À 19.ª jornada, com a derrota do Benfica em Setúbal, o Porto festejava uma vez que se via a apenas 1 ponto do líder. Mas isso foi o mais perto que os azuis e brancos conseguiram estar do primeiro lugar. Na jornada 26, depois de novo deslize encarnado (empate na Mata Real) o Porto desperdiçou uma soberana oportunidade de passar para a frente - a pressão fez-se sentir e João Carvalho (emprestado pelo Benfica ao Vit. Setúbal) marcou no Dragão porventura o golo mais importante desta edição 16/ 17.
Mas a falta de chama de que acima falávamos evidenciou-se sobretudo na Luz. No "jogo do título" o Benfica surpreendeu pela positiva, e foi Iker Casillas a manter o Porto vivo. Péssimo Raio-X do clube portista, a preferir conservar o empate, festejando-o, revelando tremenda falta de ambição (absurdo abdicar de uma oportunidade para passar a depender unica e exclusivamente de si próprio) e confiando que o Sporting seria capaz de derrotar o grande rival semanas depois. Tal não aconteceu e os índices anímicos caíram ainda mais, com a distância pontual a chegar mesmo aos 6 pontos.
A aposta em NES revelou-se um falhanço. O antigo guarda-redes trabalhou bem o sector defensivo da equipa, mas nunca soube incutir um espírito guerreiro, acabando a equipa por ser muitas vezes um vazio de ideias, à espera que uma bola bombeada para Soares ou um lance de génio de Brahimi chegasse para vencer. Não se pode aceitar que o discurso inicial (jogar cada jogo para a vitória) tenha sido depois substituído por um "Nós sabemos é que o adversário vai ter um jogo muito difícil para a semana". Um treinador ganhador não pode cair no erro de se fiar nas derrotas alheias e tem que mostrar trabalho dentro de campo, ganhando os seus jogos sem olhar a quem. Curioso também termos chegado a um ponto, e isso funcionou durante algum tempo a favor de Nuno, em que parece dar-se mais importância ao trabalho de um treinador (discurso) na sala de imprensa do que em campo, talvez por muita gente não ser capaz de detectar o que é ou não uma equipa bem treinada.
E não se pode ignorar este dado: o único jogador do plantel do Porto que sabe o que é ser campeão em Portugal chama-se Maxi Pereira. É muito grave a falta de mística no clube, visível apenas em jogadores como Danilo e Marcano, ambos exemplares toda a temporada. Casillas destacou-se nos jogos grandes; Soares revolucionou o ataque, principalmente mal chegou ao clube, e Brahimi carregou a equipa com a sua qualidade técnica.
Chega agora a altura de encontrar o substituto de Nuno Espírito Santo, já apresentado como treinador do Wolves. O herdeiro parece ser um de 3 homens: Sérgio Conceição (que está a forçar a sua saída do Nantes por "motivos pessoais"), Paulo Sousa (que rescindiu com a Fiorentina) ou Pedro Martins (que, segundo o presidente do Vitória, continua com o seu futuro em aberto). Marco Silva era a melhor hipótese, mas as exigências do português não agradaram de todo aos dirigentes dos dragões. O futuro do clube vai depender e muito das escolhas feitas durante os próximos dias.
Estávamos certos no início da época quando ordenámos o Top-3 como se veio a concretizar.
O 3.º lugar para os leões era o que se perspectivava mais provável: o facto do Sporting ter perdido algumas jóias da coroa (João Mário e Slimani) e do capitão Adrien ter ficado um pouco magoado com o fecho das portas quanto à sua saída para a Premier League eram um indício de que as coisas podiam não correr de feição em Alvalade. Os problemas foram aumentando e as guerras internas foram subindo de tom. Enquanto isto transparecia para o público geral, Bruno de Carvalho preocupava-se em gritar e apontar o dedo ao rival da Segunda Circular. A culpa é do Benfica, tornou-se então uma frase célebre no futebol português. Efectivamente, a culpa dos resultados não era do Benfica, nem dos árbitros. Bem vistas as coisas, o futebol praticado pelo clube leonino piorou substancialmente - a venda de João Mário e a época miserável de Bryan Ruiz fez desaparecer o incrível jogo interior do clube em 15/ 16 - e à medida que os resultados desfavoráveis apareciam, Bruno de Carvalho perdia o controlo e envolvia-se em algumas peripécias graves. Tanto dentro do balneário do Sporting (Adrien e William tiveram que apaziguar os adeptos com declarações) como com dirigentes adversários (presidente arouquense). Muitas distracções e muita instabilidade, que acabou por se fazer sentir no desempenho dos jogadores. O plantel nunca respirou saúde e não conseguiu corresponder às expectativas altas dos seus adeptos, perfeitamente naturais considerando a época passada.
Num ano em que Bas Dost fez 34 golos em 31 jogos e onde Gelson (rei das assistências) se confirmou como um dos maiores talentos portugueses em ascensão, a justiça deste 3.º lugar é incontestável. Até Jorge Jesus, que tanto gosta de massajar o seu ego, este ano acabou por dar o braço a torcer. Assumiu que os outros foram melhores e que todos precisavam de trabalhar mais para tornar o Sporting num candidato ao título. Pode-se considerar 2016/ 17 um ano em que os pés voltaram à terra após uma temporada de 2015/16 de grande futebol que fez sócios e simpatizantes sonhar.
Muita coisa necessita de mudar para que o Sporting volte ao nível em que se apresentou no ano passado. E tudo começa na coesão, firmeza e nível da sua estrutura.
Um clube que correspondeu este ano à dimensão dos seus adeptos. Tivemos dúvidas em relação à posição que atribuiríamos aos rivais minhotos. Equivocámo-nos. O Vitória construiu um plantel à altura do clube e com Pedro Martins - que tanto elogiámos no nossos Prémios BPF - chegou ao tão almejado 4.º lugar. Júlio Mendes reclamou o estatuto de 4.ª maior potência nacional e voltou a afirmar na final do Jamor que é e sempre será o quarto maior de Portugal e que isso se reflecte nos seus adeptos.
Uma das grandes desilusões da época. Se em anos anteriores se atribuiu a responsabilidade dos bons resultados a António Salvador, este ano tem que lhe ser apontada a responsabilidade do mau desempenho da equipa. É vergonhoso da parte do presidente bracarense apontar o dedo aos árbitros via conferência de imprensa, quando foi ele próprio a somar tiros nos pés. Claramente uma manobra de atirar areia para os olhos em ano de eleições. Todavia, uma manobra desnecessária. Era mais do que óbvia a sua vitória e só lhe ficava bem admitir os erros e limitar-se a trabalhar para que anos iguais não se repitam no futuro.
A primeira escolha (José Peseiro) não foi feliz, e aquilo que começou torto, não mais se endireitou. Veio Jorge Simão e com a sua personalidade pouco ortodoxa acabou por criar algum mau estar dentro do plantel. Os resultados não sorriam e Jorge Simão - que vinha de peito cheio pelo que havia feito no Chaves - acabou por sair pela porta pequena, somando empates e empates. Para o que restava da época, Abel foi o escolhido (como o havia sido na vitória frente ao Sporting), desta vez com vínculo até 2020.
Em termos exibicionais, Pedro Santos foi o capitão que tudo deixou em campo, evidenciando-se sobretudo no início da época, Rui Fonte cresceu ainda mais como jogador, Battaglia e Assis foram gigantes no meio-campo (o argentino no transporte, o ex-Chaves a encher o miolo) e Marafona evitou o que pôde na baliza.
Veremos como Abel agarra esta oportunidade na próxima temporada, e caberá ao Braga começar a construir o seu plantel de forma mais equilibrada, aproveitando craques como Fábio Martins (brilhou no Chaves) e jovens valores como Xadas ou Pedro Neto. Acreditamos que com Abel o Braga apresentará uma melhoria em termos de resultados, mas não será fácil recuperar o domínio do Minho.