Realizador: Mel Gibson
Argumento: Robert Schenkkan, Andrew Knight
Elenco: Andrew Garfield, Hugo Weaving, Teresa Palmer, Vince Vaughn, Sam Worthington, Luke Bracey
Classificação IMDb: 8.3 | Metascore: 71 | RottenTomatoes: 86%
Classificação Barba Por Fazer: 80
Please lord, help me get one more.
Bem-vindo de volta, senhor Mel Gibson! Depois de vários anos a ser notícia somente por motivos controversos extra-Cinema (álcool, anti-semitismo, homofobia, etc.) que o deixaram numa espécie de "lista negra" em Hollywood, uma das maiores estrelas dos anos 80 e 90 conseguiu à sua quinta longa-metragem como realizador um regresso aclamado e o respeito do sector. Se não conseguiu, devia. Desde Braveheart que Gibson não brilhava assim, limitando-se desta vez à realização.
Contexto: Hacksaw Ridge tem no centro um homem de paz em tempo de guerra, figura de sangue frio rodeado de sangue jorrado. Desmond Doss (Andrew Garfield, o outrora homem-aranha é uma das figuras do ano com este filme e Silence), pacifista, devoto cristão e objector de consciência, alista-se no exército para servir na II Guerra Mundial com um traço bem distintivo: recusa-se a pegar numa arma. Os juízos e preconceitos precipitados de todos dificultam-lhe a vida mas, protegido pela Constituição e pela sua convicção inabalável, Doss chega mesmo à linha da frente da guerra como médico, contagiando camaradas com a sua fé e mostrando que aquilo em que acreditamos é aquilo que somos. Na tomada de Hacksaw Ridge aos japoneses, parte da Batalha de Okinawa, enquanto todos tiravam vidas, Desmond Doss salvava-as.
O tributo de 2 horas e 19 ao homem que salvou 75 companheiros é um filme de contrastes. E, bem visto, não podia ser doutra maneira. Hacksaw Ridge imortaliza um símbolo de apelo à paz, mas fá-lo de forma visceral, com um grafismo e violência que atiram a criação de Mel Gibson para um lote restrito de obras-primas de guerra como Saving Private Ryan ou Apocalypse Now. Gibson repete fórmulas antigas - agarra-se à coragem e coerência de um homem de causas como fora o seu William Wallace, e na abordagem não se coíbe de mostrar tudo como já fizera n'A Paixão de Cristo. Mas nada é por isso gratuito, é sim real; e é esse o mérito que aproxima Mel Gibson do que Spielberg ou Francis Ford Coppola já tinham feito no passado (e é grande a curiosidade para ver o que Nolan fará em 2017 em 'Dunkirk' com Tom Hardy, Cillian Murphy e Mark Rylance).
Os contrastes do filme - que, muito sinceramente, só não garantimos que estará nos próximos Óscares por ser de Mel Gibson, podendo isso funcionar contra pelos inimigos que acumulou, ou a favor se os bastidores de Hollywood quiserem uma ressurreição mediática - assentam na perfeição, enganando o espectador menos preparado. Até cerca de 40% da acção, o sotaque sulista de Desmond Doss e a banda sonora de Rupert Gregson-Williams suavizam o tom, com diversos clichés e momentos (demasiado) melosos do protagonista com a sua Dorothy (Teresa Palmer). As adversidades impostas a Doss servem de interlúdio, mas quando todos pisam de espingarda em punho - menos ele - solo de guerra, o silêncio toma conta do ecrã e a violência não pede licença a ninguém. Para se fazer guerra, tem que se fazer guerra. Em Saving Private Ryan, Spielberg apostou num primeiro Acto com tudo à grande e à francesa (ou não fosse o Dia D em solo gaulês); Mel Gibson opta por passar a mão pelo pêlo do espectador, antes de lhe mostrar tudo. Sem medo de ferir susceptibilidades, sabendo flutuar entre oferecer uma perspectiva macro da guerra e particularizar os feitos de Doss numa sequência final a que ninguém fica indiferente.
O filme, como a guerra, não é para meninos. Celebra o carácter de quem teve a maior coragem - dizer não à guerra, e sim à vida, servindo o país, conquistando uma medalha de honra e inspirando o mundo.
E já agora, este é o Mel Gibson que o mundo precisa.
Bem-vindo de volta, senhor Mel Gibson! Depois de vários anos a ser notícia somente por motivos controversos extra-Cinema (álcool, anti-semitismo, homofobia, etc.) que o deixaram numa espécie de "lista negra" em Hollywood, uma das maiores estrelas dos anos 80 e 90 conseguiu à sua quinta longa-metragem como realizador um regresso aclamado e o respeito do sector. Se não conseguiu, devia. Desde Braveheart que Gibson não brilhava assim, limitando-se desta vez à realização.
Contexto: Hacksaw Ridge tem no centro um homem de paz em tempo de guerra, figura de sangue frio rodeado de sangue jorrado. Desmond Doss (Andrew Garfield, o outrora homem-aranha é uma das figuras do ano com este filme e Silence), pacifista, devoto cristão e objector de consciência, alista-se no exército para servir na II Guerra Mundial com um traço bem distintivo: recusa-se a pegar numa arma. Os juízos e preconceitos precipitados de todos dificultam-lhe a vida mas, protegido pela Constituição e pela sua convicção inabalável, Doss chega mesmo à linha da frente da guerra como médico, contagiando camaradas com a sua fé e mostrando que aquilo em que acreditamos é aquilo que somos. Na tomada de Hacksaw Ridge aos japoneses, parte da Batalha de Okinawa, enquanto todos tiravam vidas, Desmond Doss salvava-as.
O tributo de 2 horas e 19 ao homem que salvou 75 companheiros é um filme de contrastes. E, bem visto, não podia ser doutra maneira. Hacksaw Ridge imortaliza um símbolo de apelo à paz, mas fá-lo de forma visceral, com um grafismo e violência que atiram a criação de Mel Gibson para um lote restrito de obras-primas de guerra como Saving Private Ryan ou Apocalypse Now. Gibson repete fórmulas antigas - agarra-se à coragem e coerência de um homem de causas como fora o seu William Wallace, e na abordagem não se coíbe de mostrar tudo como já fizera n'A Paixão de Cristo. Mas nada é por isso gratuito, é sim real; e é esse o mérito que aproxima Mel Gibson do que Spielberg ou Francis Ford Coppola já tinham feito no passado (e é grande a curiosidade para ver o que Nolan fará em 2017 em 'Dunkirk' com Tom Hardy, Cillian Murphy e Mark Rylance).
Os contrastes do filme - que, muito sinceramente, só não garantimos que estará nos próximos Óscares por ser de Mel Gibson, podendo isso funcionar contra pelos inimigos que acumulou, ou a favor se os bastidores de Hollywood quiserem uma ressurreição mediática - assentam na perfeição, enganando o espectador menos preparado. Até cerca de 40% da acção, o sotaque sulista de Desmond Doss e a banda sonora de Rupert Gregson-Williams suavizam o tom, com diversos clichés e momentos (demasiado) melosos do protagonista com a sua Dorothy (Teresa Palmer). As adversidades impostas a Doss servem de interlúdio, mas quando todos pisam de espingarda em punho - menos ele - solo de guerra, o silêncio toma conta do ecrã e a violência não pede licença a ninguém. Para se fazer guerra, tem que se fazer guerra. Em Saving Private Ryan, Spielberg apostou num primeiro Acto com tudo à grande e à francesa (ou não fosse o Dia D em solo gaulês); Mel Gibson opta por passar a mão pelo pêlo do espectador, antes de lhe mostrar tudo. Sem medo de ferir susceptibilidades, sabendo flutuar entre oferecer uma perspectiva macro da guerra e particularizar os feitos de Doss numa sequência final a que ninguém fica indiferente.
O filme, como a guerra, não é para meninos. Celebra o carácter de quem teve a maior coragem - dizer não à guerra, e sim à vida, servindo o país, conquistando uma medalha de honra e inspirando o mundo.
E já agora, este é o Mel Gibson que o mundo precisa.