30 de novembro de 2016

Crítica: Arrival

A CAMINHO DOS ÓSCARES 2017
Realizador: Denis Villeneuve
Argumento: Eric Heisserer
Elenco: Amy Adams, Jeremy Renner, Forest Whitaker, Michael Stuhlbarg, Mark O'Brien
Classificação IMDb: 8.0 | Metascore: 81 | RottenTomatoes: 93%
Classificação Barba Por Fazer: 84


    Nem todos os realizadores são especiais, todos sabemos isso. Nem todos têm a capacidade de sair da sua praia e experimentar géneros diferentes, conseguindo mesmo assim manter uma linha e identidade constantes. Um estilo ("isto é Tarantino", "isto é Scorsese", "isto é Kubrick", "isto é Nolan", "isto é tão Woody Allen"). A cada ano que passa faz mais sentido afirmar que o canadiano Denis Villeneuve pertence a essa fina estirpe. Ele é especial, e Arrival serve de prova dos nove.
    Aos 49 anos, Villeneuve tem pouco mais de 20 de carreira nas curtas e longas-metragens. No entanto, só em 2011 com Incendies entrou no mapa, e de 2013 para cá (Prisoners, Enemy, Sicario) a legião de fãs só tem aumentado. Aos 42 anos, Amy Adams já foi nomeada para 5 óscares (quatro vezes secundária por Junebug, Doubt, The Figther e The Master, e uma como principal em American Hustle) mas nunca ganhou. Pode até - mais uma vez - não ganhar, mas é uma das Personalidades do Ano com Arrival e Nocturnal Animals, sempre em primeiro plano e com a história em torno dela, como merece.
 
    Às vezes, para fazer boa ficção científica, o truque é não usar grande ciência. Mistério, arte, criatividade, inovação. Fazer bom cinema implica tudo isso, e Villeneuve conseguiu usar todos esses ingredientes em Arrival, filme com um travezinho a Interstellar, mas sem nunca precisar de sair do nosso planeta para passar a sua mensagem.
    O guião de Eric Heisserer, a adaptar o conto "Story of Your Life" de Ted Chiang, é das melhores coisas que aconteceu em 2016, juntando-se a ele a Fotografia de Bradford Young (trabalhará no filme de Han Solo) e o velho parceiro de Villeneuve, o compositor islandês Jóhann Jóhanssson, que tudo indica conseguirá a sua 3.ª nomeação consecutiva para Óscar depois de The Theory of Everything e Sicario. Em Arrival, 12 "naves" aliens surgem na Terra e o principal desafio e tema-chave da história é apenas um: a comunicação. Nos EUA, a linguista Louise Banks (Amy Adams) é recrutada para estudar a linguagem alienígena e procurar chegar a uma tradução sem margem de erro, compreendendo... o que os trouxe cá. Com a ajuda do físico Ian Donnelly (Jeremy Renner), e pressionada pela impaciência do exército, representado pelo coronel Weber (Forest Whitaker), e do FBI na pessoa do agente Halpern (Michael Stuhlbarg), Louise quase vê as suas descobertas serem em vão quando cada um dos 12 "núcleos" humanos com medo e desconfiança, começa a fechar-se sobre si mesmo, não partilhando, não comunicando.
    Aquilo que parece uma história que vimos mil vezes falhar em filmes de Sábado à tarde na TVI, resulta em Arrival. Primeiro, pelo twist final (ou, aliás, inicial) da história e por todo o talento da equipa envolvida. Depois, pela perspectiva escolhida - o foco na comunicação, e a primazia na relação da personagem de Amy Adams com a sua filha (Adams já disse que Villeneuve a convenceu dizendo-lhe que mais do ficção científica era um filme sobre uma mãe, e também por aí se traça o paralelismo com Interstellar, cujo coração é a relação pai-filha).
    Se tudo é uma descoberta gradual em Arrival, o mérito é de Adams, subtil e contida mas a transmitir muito e a merecer uma nomeação da Academia; e claro, de Villeneuve, com ecos de Kubrick e mesmo de outros trabalhos seus, mas a conseguir intrigar o espectador antes de torcer tudo tornando o tempo não-linear (a magia de uma boa edição e a sensibilidade em contar uma história seguindo as etapas certas para ter o maior impacto possível, sem nos esfregar tudo na cara entregando a papinha toda feita numa bandeja). Como Amy Adams disse recentemente num Actors on Actors da Variety com Andrew Garfield, quando não se diz ao espectador como pensar, faz-se invariavelmente com que ele pense.

    A mensagem acaba por ser simples: comuniquem mais, digam tudo o que for preciso, e percebam que vendo a médio-longo prazo os bons momentos vão sempre pesar mais do que os maus. Amy Adams brilha, mas a estrela maior é Villeneuve, pela execução e visão brilhante, pelo ritmo e suspense que consegue manter e por fazer um bom sci-fi sem precisar de grandes efeitos. É altamente provável que Arrival acabe envolvido nos Óscares - veremos se terá destaque como nomeado para Melhor Filme ou valorizando Villeneuve e Adams, mas no mínimo terá umas 5 nomeações (Argumento Adaptado, Banda Sonora, edição/ mixagem de som e Fotografia), podendo ir até nove.
    Para os fãs de ficção científica, não podia haver melhor teaser para o potencial de Blade Runner 2049, com Villeneuve ao leme, os seus velhos conhecidos Jóhann Jóhannsson e Roger Deakins na banda sonora e fotografia respectivamente, e um elenco com Ryan Gosling, Jared Leto, Robin Wright, Mackenzie Davis, Barkhad Abdi e Ana de Armas a juntarem-se a Harrison "Rick Deckard" Ford.
    Agora vá, vão ver Arrival ao cinema e deixem as emoções vencer-vos quando a "On the Nature of Daylight" de Max Ritcher (repescada por Jóhannsson) tocar pela segunda vez.

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