Agora que já se sabem os nomeados, resta-nos continuar a contar-vos histórias sobre quais valem a pena e quais não valem, quem são os actores e actrizes do ano, quem se destacou e cresceu, e quem desiludiu. Hoje lançamos dois dos filmes mais nomeados – Silver Linings Playbook (nomeado em todas as principais categorias) e Lincoln (filme mais nomeado – com 12). Pessoalmente, a balança cai para o lado de Silver Linings Playbook. Do outro lado, Daniel Day-Lewis acumula todo o filme na sua personagem. Abraham Lincoln é enigmático e imponente, mas a verdade é que um bipolar perdido (Bradley Cooper) talvez até lhe consiga fazer frente.
Silver Linings Playbook
Realizador: David O. Russell
Argumento: David O. Russell, Matthew Quick
Elenco: Bradley Cooper, Jennifer Lawrence, Robert De Niro, Jacki Weaver, Chris Tucker
Classificação IMDb: 8.2
Fui acompanhado de uma fêmea ao cinema ver este filme e, vim a descobrir, que no mesmo dia os meus avós também fizeram o mesmo. Eu e a fêmea gostámos do filme. Os meus avós gostaram do filme. É um filme que abarca gerações. Está feito, vamos passar ao próximo.
Ok, vamos lá. Silver Linings Playbook (em português Guia para um Final Feliz) é um dos filmes do ano. Não vamos estar com rodeios. Conjuga um bom argumento – mérito para a obra de Matthew Quick – com grandes interpretações (já lá vamos), um bom trabalho de realização, boa música, tudo muito bem conduzido. Para quem gosta de só ler a sinopse: Pat (Bradley Cooper) é tem um distúrbio de bipolaridade e sai de um hospital psiquiátrico após 8 meses de tratamento. Pat esteve lá porque um dia apanhou a sua mulher no banho com o professor de História e ele não lhe estava propriamente a explicar a 2ª Guerra e então Pat decidiu espancá-lo sem parar. Voltando-se a inserir na sociedade, Pat procura gerir as suas instáveis emoções e reconquistar a sua mulher, a que o traiu, sim. Voltando para casa dos seus pais (Robert De Niro e Jacki Weaver), Pat traça a sua reabilitação com a ajuda de outra alma perdida – Tiffany (Jennifer Lawrence), recentemente viúva. O resto cabe-vos a vocês verem. Porque vale a pena ir ao cinema.
Bradley Cooper, que tem crescido como actor nos últimos anos, faz aqui o grande papel da sua carreira até agora. Justamente nomeado para óscar, tem um olhar perdido e é nele que se conjugam os 2 géneros do filme (Drama e Comédia). O filme faz-nos rir e de repente o nosso riso está a desacelerar porque a coisa está a ganhar um tom emocional forte, os timings dos actores e de David O. Russell estão sempre certos. De Niro tem uma grande cena, talvez justamente nomeado para melhor actor secundário, já não tem nada a provar a ninguém. Weaver (já tinha sido nomeada para melhor actriz secundária em 2010 por Animal Kingdom) não enche o ecrã, mas mantém um olhar desesperado e preocupado todo o filme, mostrando que nunca sabe o momento a seguir do seu filho. E depois há Jennifer Lawrence. Jennifer, não sei se já te disseram, mas és um bocado gira. Um bocado muito grande. E agrega a isso o facto de ser uma actriz que não pára de surpreender quando lhe dão oportunidades – justamente nomeada deverá disputar com Jessica Chastain o óscar de melhor actriz no próximo mês. A verdade é que o filme acumulou 8 nomeações, sendo que 7 são para categorias principais.
David O. Russell sabe puxar pelos seus actores. Em The Fighter, Christian Bale roubou todo o protagonismo e, em Silver Linings Playbook, há um equilíbrio total. O próprio filme é bipolar, como Cooper, e mostra a vulnerabilidade das personagens-chave, que apenas querem ser felizes. E que estão num ponto em que precisam de acreditar que se podem reconstruir.
Um dos filmes do ano.
Lincoln
Realizador: Steven Spielberg
Argumento: Tony Kushner, Doris Kearns Goodwin
Elenco: Daniel Day-Lewis, Sally Field, Tommy Lee Jones, Hal Holbrook, David Strathairn, Joseph Gordon-Levitt
Classificação IMDb: 8.1
Matemática simples. Steven Spielberg a realizar, Daniel Day-Lewis como principal actor e o filme é sobre Abraham Lincoln – ícone épico do universo norte-americano. Não era muito difícil perceber que ia dar no que deu – 12 nomeações (filme mais nomeado do ano) – o que não quer dizer que tenha valor correspondente ao título de “filme de 2012”, por ser o mais nomeado. Aliás, pode-se mesmo dizer claramente que não é.
Spielberg safa-se melhor do que com War Horse, mas ao passar dum cavalinho que ia passando um pano de dono para dono durante a guerra para um filme sobre Abraham Lincoln, é quase fazer batota. Pensei inicialmente que o filme fosse uma biografia da vida de Lincoln, mas não. Spielberg, que reuniu informação durante anos e anos para este filme, utilizou também parte do livro de Doris Kearns Goodwin e focou-se portanto no período da Guerra Civil americana, centrando o filme na veemência de Lincoln em levar a cabo a lei que defendia que a escravatura devia ser abolida e todos os homens deviam ser livres. Pessoalmente Spielberg, o Tarantino criou um filme de raíz em que aborda a escravatura e deu-te 1-0. A meu ver.
Hoje em dia parece que falta o “dedo de realizador” que Spielberg já teve. O homem que pôs uma rapariga de vestido vermelho num pictograma cinza e que lançou o jovem Christian Bale, no Império do Sol, a já não conseguir reconhecer os seus pais após a 2ª Guerra Mundial, parece já só filmar por filmar. Reúne informação, relata, mas já não acrescenta o que acrescentava. Já não se vê Spielberg no filme. E isso é pena. Por outro lado, isso também não é fácil quando um actor enche o ecrã com uma interpretação. Lincoln é “filme de actor” – Daniel Day-Lewis, do alto do seu 1,87m, deixa todos concentrados quando fala, e consegue ser cativante como supostamente Lincoln era. Domina a audiência dentro do ecrã e fora dele, e muito provavelmente ganhará o óscar de melhor actor principal. No entanto, este ano há boas interpretações – Bradley Cooper e Denzel Washington, pelo menos. Day-Lewis que, acrescente-se, inventou a voz que ele próprio achou a correcta para Lincoln.
Depois há o Tommy Lee Jones (que deve rivalizar com Seymour Hoffman pelo título de melhor actor secundário) e Sally Field, que saiu dos Irmãos e Irmãs e decidiu fazer de mulher do Lincoln. Bons papéis, reconheço, mas talvez um pouco sobrevalorizados.
Vale a pena ver, do ponto de vista histórico e sobretudo porque Abraham Lincoln é um epicentro de coerência, oratória e carácter. Entusiasmante, tranquilo e focalizado, assim era Lincoln, e assim foi Daniel Day-Lewis. MP