22 de janeiro de 2013

A Caminho dos Óscares: Life of Pi | Amour


Muito resumidamente, hoje lá continuamos a esmiuçar cada filme cogitado para as principais categorias dos Óscares da Academia, sendo que hoje é dia de um indiano sobreviver num barco com um tigre e de falarmos do filme de Rita Blanco. Sim, isso mesmo, podíamos chamar-lhe o filme de Michael Haneke, o filme de Emmanuelle Riva. Mas isso é cliché. E nós somos portugueses. Portanto vamos chamar-lhe o filme de Rita Blanco, que faz em Amour uma perninha como empregada. Antes disso, um filme de Ang Lee que não envolve cowboys homossexuais, mas sim um indiano que vai num barco armado em Noé, cheio de dúvidas sobre Deus. Na realidade, é um pouco mais que isso. Mas para isso, há que ler as linhas abaixo.

Life of Pi

Realizador: Ang Lee
Argumento: David Magee, Yann Martel
Elenco: Suraj Sharma, Irrfan Khan, Rafe Spall
Classificação IMDb: 8.3

    A última vez que vi um filme do Ang Lee, o Joker acabava a copular com o Prince of Persia. Tinha por isso a sensação que qualquer coisa que me pusessem à frente, seria melhor. Não gosto muito de descrever os filmes em género sinopse, mas supõe-se que isto tenha um carácter informativo portanto: Pi (nome proveniente de Piscine, interpretado pelo jovem Suraj Sharma em novo e Irrfan Khan em adulto – momento em que conta a história) é um jovem indiano cuja família tem um jardim zoológico, e que vive carregado de dúvidas sobre as várias religiões e Deus. A sua família vende o Zoo e embarcam então num navio japonês rumo ao Canadá, transportando os residentes do zoo (animais, portanto). Um desastre náutico resulta no naufrágio e na sobrevivência de Pi, que fica apenas num barco com uma hiena, um orangotango, uma zebra e um tigre de Bengala. A aventura de Pi, na tentativa de sobreviver, de enfrentar os seus medos e encontrar uma resposta Superior inicia-se então, sempre com o tigre Richard Parker (no filme explicam o nome) ao seu lado, mas nem por isso seu amigo.
    Toda a história é narrada pelo adulto Pi Patel, numa conversa com um escritor (Rafe Spall) e com um intuito muito específico: explicar a religião e a crença em Deus.
    É nitidamente um filme que se destaca pela Fotografia, mas que absorve sobretudo a narrativa de Yann Martel, resultando em cinema e sustentando a sua qualidade na reflexão final, no confronto das 2 histórias: a que o filme explora (com os animais) e a que Pi conta depois aos japoneses que o encontram (com humanos). Comparando com outro filme “indiano” – Slumdog Billionaire – embora sejam muito diferentes, este é um filme melhor, com um final que suscita dupla interpretação e sobretudo a dúvida, porque, no final de contas, é também a dúvida que sustenta a fé. Justamente nomeado para a maioria das categorias em que reúne nomeações (11 nomeações, grande maioria técnicas) – só após reflectirmos é que poderíamos dizer se estaria para nós no leque de 9 melhores filmes do ano, mas é justa em todo o caso e à priori a nomeação para Melhor Argumento Adaptado. Quanto ao Ang Lee, trocou dois cowboys por um indiano e um tigre e eles não acabaram num inter-espécies. Só por isso, os meus parabéns velho chinês.
    Não cansa como “Naufrágo” e não é extremamente surreal e metafórico como “Tree of Life”, sendo acima de tudo uma história bem contada. E bem conduzida. Mais do que pelo filme, uma salva de palmas para o Yann Martel. Palmas para ti homem canadiano.

Amour

Realizador: Michael Haneke
Argumento: Michael Haneke
Elenco: Jean-Louis Trintignant, Emmanuelle Riva
Classificação IMDb: 8.1

    Ora bem, entrem os tambores, mantenham-se os tambores a tocar: Eis um filme, nomeado para Melhor Filme, no qual entra… a Rita Blanco! Pois é Rita… Médico de Família, A Minha Sogra é uma Bruxa, Conta-me Como Foi e de repente, pumba, um Amour nomeado para vários óscares.
    Antes de mais, levanto uma questão. Qual é a percentagem facial da cara do realizador Michael Haneke que é habitada por barba? A) 30%; B) 60%; C) +. Sim, é a resposta C. Este ancião germânico realizou, em 2009, O Laço Branco (perdeu para o argentino “El secreto de sus ojos” o óscar de melhor filme estrangeiro) e agora em 2012 volta em força, conseguindo 5 nomeações para Amour (Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro, Melhor Actriz, Melhor Argumento Original e Melhor Realizador). Parece portanto óbvio, quase matematicamente, que vencerá o óscar de melhor filme estrangeiro.
    Amour é, primeiro que tudo, cinema europeu. E portanto para quem vai ao cinema (mesmo num cinema ou na sua sala) e está à espera de ser invadido e conquistado por efeitos especiais e grandes bandas sonoras, não sendo a pessoa a ir atrás do filme, provavelmente Amour não acrescentará nada à sua vida. Amour mostra um casal de antigos professores de música de idade avançada, Anne (Emmanuelle Riva) e Georges (Jean-Louis Trintignant), e mostra apenas isso. Mostra o fim da vida, o amor de uma vida, no fim do tempo, na perda de capacidades e funcionalidades, nos últimos batimentos. O definhar de Anne, paralisada e confinada a uma cadeira de rodas é explorado, num filme em que os silêncios também falam. Haneke realiza de forma fria mas rica e explora o desespero, a realidade, conseguindo no fundo o Amour. Não sendo um filme que me encha as medidas, nem achando que chega para ser nomeado para melhor filme, tiro o chapéu sim ao desempenho de Emmanuelle Riva, e também de Jean-Louis Trintignant. Reúne pelo menos duas nomeações justas, acabará por vencer o óscar de melhor filme estrangeiro e Emmanuelle Riva até acredito que seja a principal concorrente de Jennifer Lawrence e Jessica Chastain, entrando na mente da Academia. Não é um filme que toda a gente gostará, nem é um filme em que toda a gente absorverá cada imagem, cada silêncio e cada cena, mas assim é o Amour. O fim assusta-nos a todos, e acho que todos quereremos ter alguém que nos suporte e que esteja lá quando respirarmos pela última vez.
    PS: O Michael Haneke parece o Saruman, do Senhor dos Anéis. MP

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